Há pouco mais de três décadas, a CFMOTO nascia na longínqua Hangzhou, mais uma marca chinesa que parecia destinada a ficar no imenso mercado interno. Mas os tempos mudam, e mudam depressa. O que começou como fabricante de motores e componentes cresceu, consolidou-se e ousou atravessar fronteiras.
Hoje, a CFMOTO já não pede licença para entrar no palco mundial: entra de cabeça erguida, aliada a gigantes como a KTM, trazendo motores partilhados, tecnologia refinada e uma nova linguagem de design. Devagar, o preconceito começa a dissipar-se, e no lugar dele surge respeito. Respeito porque a marca deixou de ser promessa — é presença.
MÚSCULO, RESISTÊNCIA E AMBIÇÃO
A CFMOTO 800MT-X não nasceu para desfilar em cafés ou apenas para impressionar ao ralenti. Esta é a moto que traz no peito o coração austríaco — o bicilíndrico paralelo de 799 cc herdado da KTM — mas que pulsa agora ao ritmo chinês, embalado numa ciclística robusta, com suspensões de origem local de curso generoso (há que jure serem idênticas as WP), travões J.Juan e uma eletrónica que não deixa nada ao acaso.
Estamos perante 90 cavalos de força elástica, distribuídos de forma linear, e capazes de rugir quando a estrada se abre ou quando a terra se solta. O quadro é um manifesto de resistência. As rodas raiadas de 21’’ à frente e 18’’ atrás são convite aberto ao fora de estrada. O depósito de 22 litros promete longas jornadas, e o painel TFT a cores, com conectividade plena, lembra-nos que até nas mais áridas pistas do deserto há lugar para tecnologia. Contem com quase 230 Kg de peso em ordem de marcha.
Seja na estrada asfaltada que corta o Alentejo em linha reta até perder de vista, seja no carreiro pedregoso de uma serra esquecida, a 800MT-X não se encolhe. Posiciona-se no competitivo universo das maxi-trail de média/alta cilindrada, esse território fértil onde gigantes como a Yamaha Ténéré 700 World Raid, a KTM 890 Adventure R e a Honda Africa Twin marcam presença.
Mas a diferença da CFMOTO está na ousadia do equilíbrio: oferece de série aquilo que muitas rivais entregam como opção cara. Quickshifter, modos de condução, controlo de tração afinado, ABS desligável para o fora de estrada, cruise control… tudo aqui está preparado para o motociclista que quer sair e partir já, sem gastar mais um cêntimo em extras.
PARA QUE SERVE A 800MT-X?
Serve para ir mais longe. Para somar quilómetros em estrada, atravessar fronteiras e não hesitar quando o asfalto acaba. É a companheira das grandes viagens, dos dias de exploração solitária ou das epopeias partilhadas em grupo. Uma moto que não teme poeira, lama, alcatrão derretido ou chuva cerrada.
Serve para o motociclista inquieto, aquele que não suporta ver o horizonte e ficar parado. Serve para o aventureiro que sonha com Marrocos, com a Estrada Nacional 2, com os Balcãs ou com a Patagónia. Mas serve também para quem, no dia-a-dia, quer uma moto equipada até aos dentes e capaz de enfrentar o trânsito matinal com a mesma confiança com que enfrenta um trilho pedregoso ao fim de semana.
É a moto para quem reconhece que a aventura não é monopólio das marcas históricas. É para quem aceita que uma marca chinesa pode entregar qualidade, emoção e confiança. É para quem tem a coragem de escolher diferente e o coração disposto a bater ao ritmo da descoberta.
UMA MOTO QUE PEDE ESTRADA E ROTAÇÕES
Há motos que nos recebem com um sorriso fácil, quase convidativo. A CFMOTO 800MT-X não é assim. O primeiro impacto é desafiante, um olhar de frente para uma maxitrail de presença larga, de ombros levantados, de design arrojado que parece querer medir forças connosco antes mesmo de darmos à ignição.
E logo ali, no primeiro toque, percebemos: esta é uma moto grande, física, exigente. Aos 1,80m ainda ficamos a meio caminho de pousar os dois pés totalmente no chão. É uma altura que, parada, pesa mais na mente do que no corpo — porque em andamento, curiosamente, a moto mostra-se dócil, equilibrada, ágil até nas pequenas manobras. No entanto não nos iludamos: no caos das ruas estreitas de Lisboa, no empedrado irregular de tantas cidades portuguesas, esta 800MT-X não será a companheira mais prática do dia-a-dia. Talvez seja por isso que raramente a vemos a rolar em meios urbanos.
E quando a estrada se abre, aí sim, ela revela o seu verdadeiro palco. A posição de condução é um trono relativamente confortável, com um guiador bem colocado e um encaixe natural dos pés. Já a proteção aerodinâmica, embora generosa, não se entende bem com capacetes de pala: vibrações incómodas perturbam a calma do vento.
Ainda assim, facilmente ajustamos o ecrã — um detalhe simples que mostra o cuidado da marca. Com um capacete integral, o desconforto desaparece e a viagem flui. E flui porque o motor pede isso mesmo: rotação, estrada, quilómetros. A partir das 4.000 ou 5.000 rotações, ele engole o asfalto com voracidade, entrega binário e potência com um ímpeto que nos arranca um sorriso dentro do capacete. A ciclística acompanha este fôlego com elegância, apoiada em suspensões confortáveis, reguláveis e capazes de dar ao condutor o acerto que deseja.
Nenhuma moto é perfeita, e a 800MT-X também guarda no alforge alguns detalhes menos conseguidos. Um deles já o referi: a turbulência aerodinâmica quando usamos capacetes com pala. É um daqueles pequenos incómodos que não estraga a experiência, mas que nos obriga a procurar ajustes e outro equipamento. Depois, há um ponto mais sensível: o calor que se liberta do motor e que se sente, de forma bastante evidente, junto à perna esquerda. Em dias de maior temperatura ou no pára-arranca das cidades, esse sopro quente transforma-se num companheiro indesejado. E, por fim, o banco. Ao início, parece confortável, mas com o acumular dos quilómetros revela alguma rigidez que acaba por se fazer notar.
São detalhes que não ensombram o conjunto, mas que merecem atenção em futuras evoluções. Até porque, quando uma moto nasce tão ambiciosa, cada pequeno retoque faz toda a diferença no caminho da excelência.
TURISMO E AVENTURA
Fora de estrada? Sim, mas com limites. Esta, na nossa opinião, não é uma enduro disfarçada e sim uma moto de turismo de aventura. No cascalho largo, nos caminhos de terra generosos, aceita o desafio e mostra-se capaz — para quem tem unhas, como se costuma dizer. Mas não é para brincadeiras de quintal: a sua dimensão e peso não a recomendam para grandes malabarismos fora do alcatrão. O seu destino é outro. Esta é uma moto para viagens longas, para rotas que não acabam quando o asfalto termina, para aventuras que pedem bagagem, cruise control, quickshifter e a ligação natural à tecnologia. Turismo, sim — todavia turismo que ousa atravessar fronteiras, literalmente e metaforicamente.
Um dos melhores aspetos fica para o fim, sendo um ponto que não podemos ignorar: o preço. A CFMOTO 800MT-X é muita moto por cerca de 9.000 euros. Sendo económica também no dia a dia ao sorver apenas pouco mais de quatro litros de liquido inflamável doirado por cada cem quilómetros de personalidade esbanjada.
A CFMOTO 800MT-X é uma proposta que junta motor, ciclística, eletrónica e acabamentos dignos de motos de segmentos mais caros. É um absoluto statement da marca: mostrar que se pode entregar qualidade e ambição sem pedir um cheque a dobrar e uma promessa de viagem, de aventura, de estradas que nos levam mais longe.