A Voge DS800 Rally chega ao nosso horizonte como quem cruza o nevoeiro do amanhecer com a certeza de que pertence ao trilho, à poeira e também às estradas largas que Portugal oferece. Há motos que se apresentam com timidez; esta não. A DS800 Rally tem aquela postura firme de quem conhece o seu próprio destino: ser uma moto de aventura séria, de desafio autêntico, capaz de levar-te ao limite sem exigir o pagamento de uma prestação mensal de uma maxi trail premium.
A primeira impressão começa sempre pelo olhar, e aqui a Voge joga forte. O desenho é nitidamente inspirado no universo rally-raid, com aquela frente esguia, pensada para abrir caminho no pó, e um corpo atlético que deixa espaço ao movimento do condutor, tanto sentado como em pé. O acabamento a imitar carbon flare nos painéis, as proteções robustas, os faróis auxiliares LED, os protetores de mãos musculados e o enorme depósito de 24 litros dão-lhe aquele ar sério de moto que não veio para fazer figuração.
Esta é uma trail que parece ter sido moldada pelas mesmas mãos que idealizam dunas infinitas e vales solitários — e depois polida para agradar aos olhares urbanos quando regressa à cidade. O ecrã TFT vertical de 7 polegadas, a conectividade completa com o smartphone e os pequenos luxos como punhos e assento aquecidos mostram que a Voge não abdica do conforto moderno, mesmo quando veste fato de competição.
MOTOR NOVO VIDA NOVA
Por baixo desta carenagem de aventura bate o coração de um novissimo bicilíndrico paralelo de 798 cc, com ordem de ignição a 270 graus — aquele pulsar quente e irregular que dá alma. São quase 94 cavalos a 9.000 rpm, e 81 Nm de binário que surgem cheios, com aquela tração que nos empurra para a frente quando o trilho aperta e a adrenalina pede espaço.
A embraiagem deslizante torna tudo mais dócil nas reduções agressivas; a caixa de seis velocidades responde com precisão. É um bloco que não pretende reinventar a física, mas antes entregar confiança, vibração certa e uma personalidade que se quer sentir nas mãos, no corpo e no caminho.
A ciclística foi montada com pensamento claro: ser forte, previsível e capaz. Suspensões KYB totalmente ajustáveis, com 200 mm de curso à frente e 190 mm atrás, alimentam aquela sensação de “pernas longas” que tanto apreciamos nas trails vocacionadas para o fora de estrada. O quadro em aço, o braço oscilante em alumínio, as jantes de raios 21/18 calçadas com Pirelli Rally STR e a altura ao solo de 220 mm deixam muito claro que esta moto terá sempre vontade própria de sair do alcatrão. Detalhes como o amortecedor de direção ajustável, o guarda-cárter em alumínio e os pedais articulados fazem lembrar que alguém, na Voge, também gosta de se sujar.
Os travões Nissin com duplo disco à frente sem deslumbrar inspiram confiança, e o ABS e o controlo de tração — ambos desligáveis — dizem-nos que esta moto não teme piso solto nem escorregadio. Os sensores TPMS e o descanso central são pormenores práticos que tornam a vida do aventureiro mais fácil. E o depósito de 24 litros? Esse é o passaporte para longas jornadas, para meter quilómetros até onde a paciência dos outros acaba.
AFIRMAÇÃO!
Para compreender verdadeiramente esta moto é preciso colocá-la no seu contexto: numa era em que as marcas chinesas já não chegam com a postura tímida de outrora, e sim com propostas cheias de engenharia, ambição e qualidade palpável. A Voge, marca do grupo Loncin, tem posto os pés no terreno europeu com determinação. E a DS800 Rally representa isso mesmo: uma afirmação. Não chega para competir com o segmento — chega para o inquietar.
É inevitável compará-la às grandes referências do mundo Adventure de média cilindrada. No papel, e sobretudo no preço, a Voge mete respeito: oferece equipamento que, noutras marcas, só aparece bem acima da fasquia psicológica dos dez mil euros. A suspensão ajustável, o arsenal eletrónico, a autonomia generosa, o hardware de travagem e até pequenos mimos como os aquecimentos seriam argumentação suficiente. No enatanto o que mais impressiona é o equilíbrio: esta não é uma maxi trail que assusta os iniciados, nem uma trail leve que se esgota aos primeiros quilómetros de autoestrada. É o ponto intermédio certo — aquela terra de ninguém onde tantos motociclistas procuram uma companheira que dê confiança no cascalho, comodidade na viagem e capacidade para o dia-a-dia.
PARA LÁ DO EQUILÍBRIO HÁ A FACILIDADE
Mesmo que esta Prova tivesse sido longa, mesmo que o calendário tivesse oferecido sol em vez de chuva, nevoeiro e vento, mesmo que os quilómetros fossem muitos — a sensação teria sido a mesma: saberia a pouco.
E talvez essa seja, logo à partida, a melhor nota que posso dar a esta moto. A verdade é que esta prova ficou marcada por condições atmosféricas profundamente desagradáveis. A estrada molhada, o frio húmido que se entranhou, o céu permanentemente cinzento. Tudo parece ter conspirado para encurtar aquilo que eu gostaria que tivesse sido uma longa jornada. Todavia a DS800 Rally fez aquilo que as boas motos fazem: iluminou as horas escuras. Como podem ver nas imagens
O que realmente aqui surpreende é a facilidade com que tudo acontece. Há um “teste” que não vem em nenhuma ficha técnica: o de fotografar uma moto. Empurra-se para a frente, puxa-se para trás, roda-se um pouco para encontrar o ângulo certo…, e aí percebe-se o seu equilíbrio natural. A DS800 Rally passa esse teste com distinção. Move-se com leveza, transmite naturalidade a baixa velocidade e revela logo aquilo que mais tarde confirmamos a conduzir: há aqui uma plataforma muito bem pensada.
ALMA E PRAZER PURO
Na cidade a Voge DS800 Rally sente-se segura, no estradão diverte, e em estrada… curva que se farta. A ciclística — suspensões, travões e geometria — está afinada com um cuidado pouco comum neste segmento. Não é uma moto de catálogo; é uma moto de engenharia. A travagem, não sendo referencial, está ao nível certo: consistente, previsível, sem comprometer o ritmo.
No entanto, sublinhamos, o grande protagonista é o motor. O novo bloco criado especificamente para esta moto, já sem amarras de licenças ou parcerias, é uma das maiores surpresas do teste. Sobe de rotação com vitalidade, com vontade própria, com uma sonoridade que se torna viciante a partir das 3.000 ou 4.000 rpm. É um motor com alma — e não digo isto com ligeireza. É daqueles que nos fazem procurar mais uma curva, mais uma reta, mais uma oportunidade para ouvir o eco do escape.
No fora de estrada ligeiro, mesmo com chuva e piso traiçoeiro, a DS800 Rally ofereceu sempre momentos genuínos de prazer. É uma moto que gosta de mexer o corpo — e isso sente-se.
Há pontos a melhorar, naturalmente. O controlo de tração é o mais evidente. É demasiado interventivo quando começamos a abusar — e intervém de forma algo errante. É seguro? É. Mas pode (e deve) ser refinado em futuras versões ou atualizações electrónicas. Depois, o interface entre os botões e o painel de “instrumentos” podia estar mais intuitivo. Nada grave, mas nota-se. Finalmente, numa moto tão bem equipada, fazem falta dois elementos que elevavam a experiência para outro patamar: quickshifter, para completar a personalidade do motor e Cruise Control, porque esta moto pede estrada larga e viagens maiores.
QUEREM AVENTURA?
Para quem está a preparar a Voge DS800 Rally para viagens mais longas, a marca disponibiliza duas soluções completas desenvolvidas em parceria com a SHAD. A primeira aposta num conjunto de bolsas macias, composto pelas ferragens específicas para a DS800 Rally, dois alforges TR30, um saco traseiro TR50 e um saco de depósito TR10CL. Os alforges laterais TR30 usam suportes rígidos dedicados, são impermeáveis e têm fecho com chave tanto para ficarem bloqueados à moto como para a sua abertura. O saco traseiro TR50 oferece uma capacidade generosa, suficiente para transportar até dois capacetes modulares integrais, e também fica bloqueado ao suporte superior da moto. Já o saco de depósito TR10CL, totalmente impermeável, prende-se através do sistema rápido Click System e inclui igualmente bloqueio por chave no tampão do depósito. Até 31 de dezembro, este kit pode ser adquirido por 888 € mediante a compra da moto.
A segunda solução disponível opta por malas rígidas em alumínio, igualmente com ferragens dedicadas à DS800 Rally, e inclui as duas malas laterais SHAD TR36 e o top case TR55. As laterais TR36 destacam-se pela construção sólida, pelo mecanismo de fecho duplo e pela pega retráctil que facilita o transporte fora da moto. O top case TR55, com características equivalentes, é um dos baús de alumínio mais leves da sua categoria com capacidade para dois capacetes modulares integrais. Até 31 de dezembro, este conjunto pode ser adquirido por 1 198 € com a compra da moto.
Ambas as propostas dão à DS800 Rally a versatilidade necessária para viagens mais longas, seja com equipamento macio e mais leve, seja com a robustez das malas rígidas de alumínio — sempre com a vantagem da compatibilidade directa e da montagem pensada especificamente para este modelo.
SERÁ ESTA A MOTO IDEAL PARA TI?
É também por isso que esta moto se dirige a vários tipos de motociclistas. Aos aventureiros que gostam de explorar pistas e serras ao fim de semana, que procuram uma máquina que aguente maus tratos e que não seja um monstro de 250 kg.
Aos viajantes que fazem quilómetros sem olhar para trás e que valorizam autonomia, conforto e uma postura de condução natural. Aos motociclistas que querem uma trail para evoluir no fora de estrada, mas que recusam abdicar de tecnologia e de uma estética com presença. E, claro, aos que descobriram que o mercado chinês já está muito acima daquele estigma antigo: hoje, marcas como a Voge entregam motos maduras, bem equipadas, bem pensadas — e com um preço que continua a desafiar a concorrência.
No fundo, a Voge DS800X Rally é uma moto com algo para provar — e com todas as armas para o fazer. Não tenta ser perfeita. Tenta ser verdadeira: aventureira, robusta, prática e apaixonada por caminhos onde o silêncio pesa e a liberdade cresce. E isso, no universo d’O Escape Mais Rouco, conta muito.
Por razões várias, a prova não permitiu um cálculo rigoroso de consumos, mas a nosssa estimativa aponta para cerca de cinco litros de sumo de dinossauro bebidos por cada cem quilómetros de prazer honesto de condução. E depois, o preço. Menos de 7.900 € por tudo aquilo que esta moto oferece é, francamente, difícil de acreditar. É o tipo de valor que nos faz voltar atrás nas notas, reler tudo e pensar: “sim… está aqui qualquer coisa especial.”
A Voge DS800 Rally não é perfeita e sim apaixonante. É honesta, divertida, surpreendente, muito bem construída e equipada. E, acima de tudo, é uma moto que nos deixa sempre com vontade de fazer mais quilómetros. E talvez seja esse o maior elogio que se pode dar a uma moto: quando a devolvemos com a sensação de que ficámos a meio da história.
Raterometro ******** (8/10)















👌👌👌
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