Na passada semana, na apresentação nacional promovida pela Multimoto, ficámos a conhecer de perto a BENDA Motors — uma marca chinesa que chega a Portugal com a ambição de se afirmar num mercado cada vez mais exigente e sofisticado. É um nome novo por cá, mas vem carregado de estrutura: por trás está a Hangzhou Saturn Power Technology Co., Ltd., fundada em 2016 e detentora de duas fábricas, no norte e no sul da China.
O grupo nasceu com uma missão clara — desenvolver tecnologia própria, construir motores internamente e desenhar motos que se distingam não só pela performance, mas também pela forma. E é precisamente aí que a BENDA quer marcar terreno: na estética e na engenharia.
Desde 2017 que a marca tem vindo a montar um ecossistema industrial robusto. Criou a sua Divisão de Motores, abriu escritórios de design e engenharia na China e na Áustria, e começou a desenhar motores prontos para produção em massa. Em 2020, a Chinchilla 300 foi o primeiro sucesso comercial; em 2021, com a LFC 700 e a Rock 300, o nome BENDA começou a ser ouvido fora do mercado asiático. No ano seguinte, a empresa expandiu-se para o universo dos veículos de quatro rodas, investindo 700 milhões de RMB (cerca de 85 milhões de euros) numa nova fábrica em Hangzhou — um sinal claro de fôlego industrial.
Em 2023, a Darkflag 500, a primeira cruiser V4 fabricada na China, mostrou que a marca não tem medo de arriscar onde até agora só os gigantes jogavam. Ao lado dela, a Chinchilla 500 e a Napoleonbob 500 consolidaram o posicionamento da BENDA nos segmentos cruiser e bobber. Em 2025, a gama já se estende das 250 cc às 1000 cc e mais, cobrindo desde os condutores iniciantes até aos mais experientes.
DESENHO E TECNOLOGIA
Mas o que realmente distingue a BENDA — e o que ficou evidente na apresentação onde o ESCAPE esteve presente — é a obsessão pelo design industrial. O desenho é tratado como uma linguagem emocional e técnica ao mesmo tempo. As linhas, as proporções e o acabamento não são apenas estética: são o reflexo de uma filosofia que quer fazer da moto uma extensão da personalidade de quem a conduz. A marca trabalha com equipas de design na Áustria e na China, numa parceria que procura captar o melhor dos dois mundos — o arrojo oriental e o rigor europeu.
Outro pilar essencial é o desenvolvimento independente de motores. A BENDA produz internamente desde bicilíndricos em linha (de 125 cc a 2000 cc) a V-Twins e V4, e até seis cilindros em linha, o que mostra uma autonomia técnica rara neste segmento. A marca não depende de plataformas partilhadas — e isso, para quem conhece a indústria, é uma diferença significativa.
No campo tecnológico, a BENDA procura levar soluções de ponta a um público mais vasto. Falou-se hoje em sistemas como o cruise control, o acelerador eletrónico, a suspensão adaptativa eletrónica automática e o ram-air frontal otimizado — exemplos de como a engenharia está a ser aplicada com inteligência e não apenas como adorno. Há ainda planos de integração de inteligência artificial e até holografia em futuros modelos. Pode soar futurista, mas é um sinal claro da direção em que a marca quer ir: motos que comunicam, que aprendem, que reagem.
Tudo isto acontece num contexto em que a forma como se vive o motociclismo está a mudar. As motos já não são apenas máquinas de transporte — são símbolos de identidade, liberdade e sociabilidade. A BENDA parece compreender isso, e posiciona-se como uma marca que quer dialogar com uma nova geração de condutores, sem ignorar os que ainda preferem o som metálico e o cheiro da gasolina.
PERSPETIVA PARA PORTUGAL
A entrada da BENDA no mercado português, pelas mãos da Multimoto, é mais do que simbólica — é estratégica. Portugal é um terreno fértil para novas propostas que tragam design forte, motores credíveis e preços equilibrados. E é precisamente aí que a BENDA pode encontrar espaço para crescer.
O mercado das cruisers está a despertar. Cada vez mais motociclistas procuram estilo, presença e identidade, não apenas utilidade. A BENDA tem aqui uma oportunidade clara: captar quem quer algo diferente das marcas tradicionais, como Harley-Davidson ou Indian, mas sem pagar o preço da exclusividade americana. Se conseguir manter uma boa relação qualidade/preço, pode tornar-se uma alternativa real.
Há também o potencial de atrair quem valoriza componentes modernos, design arrojado e um “look de topo”, mesmo que o preço final não seja o mais baixo. O que conta é o valor percebido — e, nesse campo, a BENDA joga com trunfos visuais fortes.
Nos modelos de baixa e média cilindrada (250-500 cc), o apelo é outro, mas não menor: são motos ideais para quem quer entrar no mundo das cruisers, fazer passeios de fim de semana ou simplesmente ter uma moto com carácter, sem custos proibitivos de manutenção. Se a rede pós-venda da Multimoto conseguir garantir confiança e apoio, o terreno está preparado.
AS TRÊS PROTAGONISTAS DO DIA
Portugal tem dimensão modesta, mas paixão imensa por motos. E a BENDA chega no momento certo, quando o público está aberto a experimentar o novo, desde que o novo seja bom. A BENDA quer “unleash the ride” — libertar a condução. Nós, no Escape Mais Rouco, queremos apenas confirmar se essa liberdade é mesmo tão entusiasmante quanto soa.
Três motos, três linguagens, três formas de interpretar o prazer de conduzir. A Benda apresentou-se em Portugal com um trio que resume bem a sua filosofia: design ousado, motorização moderna e uma vontade clara de ocupar espaço no imaginário dos motociclistas. A Napoleonbob 500, a Chinchilla 500 e a LFC 700 não são apenas produtos — são declarações de intenções. Tivemos um breve contacto com elas nos arredores de Lisboa e nas sempre entusiasmantes estradas da Serra de Sintra.
NAPOLEON BOB 500 – O REGRESSO DO ESPÍRITO BOBBER
A Napoleon Bob 500 é uma Bobber de corpo inteiro, inspirada nas linhas clássicas americanas dos anos 50, mas reinterpretada com irreverência e tecnologia atual. Por baixo da estética musculada e do assento baixo, quase rente ao chão, pulsa um motor V-Twin de 475,6 cc, com oito válvulas, refrigeração líquida e uma taxa de compressão de 11,5:1. A potência ronda os 47 cavalos às 8 800 rotações por minuto, com um binário máximo próximo dos 42 Nm às 6 700 rpm — números que, na prática, se traduzem num comportamento vivo, elástico e surpreendentemente vigoroso.
A transmissão faz-se através de uma caixa de seis velocidades, assistida por embraiagem deslizante, e uma transmissão final por correia dentada, algo que reforça o apelo cruiser e o conforto de rolamento. Com cerca de 215 quilos em ordem de marcha, pneus largos (150/80-16 à frente e 180/65-16 atrás) e ABS de dois canais, a Bob revela uma presença firme na estrada. O assento, a 695 mm do solo, obriga a uma posição de condução baixa e dominante, com o guiador “Flying Wing” a abrir o peito e os pés avançados.
Na estrada, o conjunto surpreende de forma visceral. O motor sobe de rotação com leveza, o som é muito encorpado, e a resposta ao acelerador entusiasta. O comportamento é estável, embora os pneus de origem peçam algo mais nobre, e a travagem, ainda que suficiente, não tem a precisão que o conjunto merecia. Mas o carácter está lá — a Napoleonbob é um tributo moderno ao espírito Bobber: estilosa, desafiante e cheia de alma.
CHINCHILLA 500 – A ALMA URBANA E ELEGANTE
Com a Chinchilla 500, a Benda suaviza o tom e mostra o outro lado da moeda. Partilha com a Napoleon o mesmo motor V-Twin de 475,6 cc, refrigerado a líquido e com distribuição por duplo comando e oito válvulas, debitando cerca de 47 cavalos de potência máxima e 42 Nm de binário. Mas aqui o enquadramento é diferente: a Chinchilla veste-se de cidade e de estrada secundária, de serenidade e de elegância.
A caixa de seis velocidades, a transmissão final por correia, o ABS de dois canais e o peso na casa dos 215 quilos, combinam-se com uma altura de assento de 705 mm para oferecer uma moto acessível, confortável e intuitiva. As suspensões dianteiras invertidas e o amortecedor traseiro hidráulico dão-lhe uma leitura suave do piso, e o conjunto mostra-se mais equilibrado, mais dócil e menos provocador do que a sua irmã Bobber.
Na condução, é notório o carácter mais amistoso do chassis e a posição de condução menos exigente. O motor continua a responder com vigor, mas sem a tensão da Napoleon, o que faz da Chinchilla uma moto ideal para quem procura prazer estético e praticidade em doses equivalentes. Mantém, todavia, as mesmas margens de melhoria: pneus que mereciam ser de gama superior e uma travagem que, sendo competente, poderia beneficiar de maior mordida inicial. A Chinchilla é, por assim dizer, a cruiser do dia-a-dia — a que nos faz querer sair de casa sem destino, apenas para sentir o vento.
LFC 700 – A PROVOCAÇÃO EM ESTADO SÓLIDO
E depois há a LFC 700, a moto que parece saída de um estúdio de ficção científica e não de uma linha de montagem. Tudo nela é excesso, mas de um excesso pensado. O motor é um quatro cilindros em linha de 677 cc, 16 válvulas, refrigeração líquida, capaz de debitar cerca de 84 cv às 11 000 rpm, e um binário próximo dos 61 Nm às 8 600 rpm. A caixa é de seis velocidades, com embraiagem assistida e deslizante, e a transmissão final é feita por corrente.
Com quase 290 quilos em ordem de marcha, a LFC 700 impõe respeito. O pneu traseiro de 310 mm — sim, 310 — é uma das suas marcas registadas, conferindo-lhe uma estética única e uma pegada imensa, digna de uma dragster. À frente, uma forquilha KYB invertida ajustável, atrás um amortecedor KYB ajustável, ambos de bom nível e com afinação firme, contribuem para uma estabilidade irrepreensível em reta e um comportamento previsível em curva.
A posição de condução é baixa, mas menos radical do que se poderia imaginar; o banco situa-se a cerca de 700 mm do solo, o que ajuda à manobrabilidade a baixa velocidade. E, quando o motor desperta, o som metálico dos quatro cilindros em linha anuncia outra dimensão de prazer. A LFC 700 não é uma cruiser tradicional — é uma afirmação estética e técnica. Desafia convenções, exige respeito e recompensa com uma experiência sensorial rara. É exótica, provocadora e, talvez, destinada a tornar-se peça de coleção.
TRÊS MOTOS, UMA NOVA VOZ NA ESTRADA
Três motos, três linguagens e uma só mensagem: a Benda veio para ser levada a sério. A Napoleonbob 500 encarna o lado visceral e estético do motociclismo; a Chinchilla 500 oferece uma interpretação mais civilizada e elegante; e a LFC 700 é a prova viva de que a audácia ainda tem lugar no design contemporâneo.
O grupo Multimoto merece um aplauso pela coragem de trazer esta marca para Portugal — por acreditar que o mercado nacional tem espaço para propostas diferentes, arrojadas e emocionalmente intensas. A Benda chega com estilo, com músculo e com alma. Que estas três máquinas encontrem estrada, quilómetros e histórias. E que marquem o início de um capítulo novo e entusiasmante na cultura motociclística portuguesa. Bem-vinda, Benda. Que o futuro soe rouco — como gostamos.