terça-feira, 1 de fevereiro de 2022

Aprilia Tuareg 660 à prova

Os tuaregues, também denominados imuagues, são um povo berbere - conjunto alargado de povos do norte de África - constituído por pastores nómadas, agricultores e comerciantes, que no passado controlaram a denominada rota das caravanas no deserto do Saara. Hoje maioritariamente muçulmanos, os tuaregues são os principais habitantes da região Saariana do norte da África, distribuindo-se pelo sul da Argélia, norte do Mali, Níger, sudoeste da Líbia, Chade e, em menor número, pelo Burkina Faso e leste da Nigéria. Estima-se que existam entre milhão e milhão e meio de indivíduos nos vários países que partilham aquele deserto. 


A origem da palavra “tuaregue” é muito controvertida. Por um lado, se a palavra árabe “tuaregue” parece derivar de targa - nome berbere da província da Fazânia no sul da Líbia - por outro, alguns autores defendem que a origem da palavra "tuaregue" é a palavra árabe ṭwâriq, que significa "salteadores". Já outros sustentam ainda que a palavra deriva do árabe "abandonados". Certo é que os tuaregues se denominam a si próprios de imuagues, isto é, "os homens livres", o que fará deles os derradeiros homens verdadeiramente livres do planeta, na visão algo romântica de alguns viajantes ocidentais.


Encontramos assim no ADN desta Aprilia um sentido e valor que é tão caro ao motociclista: Liberdade. Liberdade esta que vai ao encontro daquele que se assume como um possível provérbio dos povos de regiões ainda hoje inóspitas: “se tens um destino, até o deserto se torna uma estrada”. 

UMA FAMA ANTIGA 
No entanto, nada árida é a origem desta novíssima Tuareg 660. Muitos talvez já se tenham esquecido – outros pura e simplesmente ignoram - mas a Tuareg nasceu na Aprilia com o fascínio dos primeiros ralis africanos. A gama, algo atomizada, viveu entre 1985 e 1994, começando nas versões de 50 e 125 cc (motores a dois tempos de origem Minarelli); já as 350 e 600 cc com motores a quatro tempos surgiram como versões Rally com uma natureza mais “fora de estrada”. A versão Wind, possivelmente a mais popular, incluiu os modelos 350 e 600 - motor Rotax de 46 cv - e surgiu em 1990. Esta última Tuareg foi o passo necessário para a chegada já em 1993 da lendária Pegaso, moto que conta ainda hoje com muitos fãs entre os motociclistas da minha geração. De sublinhar que a Aprilia chegou a disputar o Dakar em 1989 com esta moto – Tuareg Wind 600 - envolvimento este que foi feito pela própria marca de forma oficial. 


De linhas desafiantes – pessoalmente gosto muito - a nova Tuareg parte da unidade motriz que equipa as nossas conhecidas RS 660 (link) e Tuono 660 (link). Este motor revisto mecânica e eletronicamente (80 cv, 70 Nm) e que soa de forma maravilhosa quando rodamos o punho de forma decidida, é montado num quadro tubular de aço. As suspensões Kayba e a travagem Brembo compõem o kit que se agarra ao solo com uns surpreendentes e eficazes pneus mistos Pirelli Scorpion Rally STR (60% asfalto, 40% off road). O conjunto alto (860mm do banco ao solo) mas de centro de gravidade baixo, pesa pouco mais de duzentos quilos em ordem de marcha. 


FÁCIL DE ENTENDER 
Muito mais importante do que a frieza dos números é o aconchego dos químicos que disparam no cérebro e se espalham pelo corpo. A posição de condução revela-se correta com o passar dos quilómetros – o que significa que há uma margem de adaptação – quer sentado quer em condução apeada, mostrando mesmo uma rara síntese destes dois momentos. E rapidamente duas palavras-chave desta prova nos iluminam: facilidade e leveza. 


A leveza é obviamente relativa e significa o excelente trabalho da casa italiana em facilitar a vida ao seu cliente. A moto parada mexe-se com destreza e a baixa velocidade revela uma natureza dócil que inspira confiança (na cidade e no campo) mesmo àqueles que não estão familiarizados com estas geometrias. A facilidade de utilização e o prazer na condução acabam por ser consequências deste belo trabalho


Tudo é equilibrado e competente – apesar do accionamento da caixa ser algo rígida - seja no asfalto seja por maus caminhos. Não há sequer sintomas de vibração e as suspensões revelam o seu carácter superior reforçando a confiança que estes Pirelli têm para oferecer – parecem feitos de propósito para este conjunto. De sublinhar ainda a riqueza electrónica – Traction Control, Engine Break, Cruise Control e Engine Map com três modos pré-programados e mais um totalmente parametrizável. Todos estes elementos concorrem para que esta nova Toureg seja ainda muito entusiasmante numa estrada de asfalto retorcido. Numa palavra: a Aprilia Tuareg é uma moto à escala humana


QUALIDADE E COMPORTAMENTO DE TOPO 
Há pois em todo o ambiente que envolve esta Aprilia Tuareg 660 o denominador comum da Liberdade enquanto valor. E foi assim que me envolvi com ela. Pedi-lhe que me levasse a locais ermos, apesar de não muito longínquos face à minha base lisboeta, e a trail italiana respondeu de forma gloriosa sempre que abandonei o asfalto e beijei o pó.


Deixo-vos uma curiosidade. Foi nela que conquistei dois pontos pitorescos todavia esquecidos por quem habita nesta região do país: a zona norte da arriba fóssil da Costa da Caparica – com uma vista sumptuosa para Lisboa e a barra do Tejo – e a foz do rio Sorraia que desagua no Tejo quase, quase, a beijar o mar da palha. Pequenos momentos inesquecíveis, como são todas as “primeiras vezes”. 


A Aprilia solicita 12.200€ por esta Acid Gold, conjunto de enorme qualidade e excelente comportamento que vai deixar saudades. Esta italiana cheia de personalidade, como demonstram as imagens do Gonçalo Fabião, reclamou pouco menos de cinco litros do precioso ouro líquido carregadinho de impostos, por cem quilómetros de sorrisos no rosto.

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